Sunday, July 6, 2008

o corpo deitado

o corpo, se estiver deitado
em fato de banho,
sente na pele o vento,
e se estiver debaixo da sombra dum pinheiro
sentirá pequenas agulhas secas tocando o peito,
e se fechar os olhos ouvirá os pássaros
e as crianças a chapinhar na água.

dizia dela o veloz pensamento

dizia dela o veloz pensamento
ecoando egoísta nos sentidos
olhos de gazela
pontos de luz e desejo

por cima dos telhados

por cima dos telhados as alcantiladas penhas
rasgando o céu azul com algumas nuvens preguiçosas
e o rosto da alma aberta para os vários horizontes
ainda que a sustentabilidade seja precária
a longo prazo se Deus quiser

canas verdes

canas verdes cruzadas por ferros forjados
enterrados na terra seca a bordejar a ribeira
com as cigarras esganiçadas por vezes
esquecidas dos seus laços de amizade e calor

Friday, July 4, 2008

mozart

o avião traz duas peças de metal

o avião traz duas peças de metal
encomendadas ontem ao meio dia
o bezerro de ouro e a menina inglesa
tratamento a todo o custo
na mesma ignorância primária
já os passageiros em bicos de pés
olhavam pelas janelas as nuvens
e os anjos encavalitados
nas ambulâncias oxigenadas
todos estão de parabéns
céus infernos e purgatórios
porque já não há nada disso
é tudo igual

duas vezes mentiu

duas vezes mentiu
duas vezes viu
quem quiser pariu
quem ouviu mentiu

convêm tomar atenção

convêm tomar atenção às palavras pavorosas
ao mesmo tempo prevenir as urtigas
não caiam elas de cu
escandalizadas com o Carnaval
embalado numa marmita de alumínio

experimenta a comida

experimenta a comida da cantina
da sopa dos pobres
mata a fome na mesma
apesar de uns pensarem
nas ruas limpas

o fim da idade

o fim da idade
à mesma hora
da laranja
espreita
as frequências
mais do que merecidas
férias na praia
com aranhas

a tristeza caminha

a tristeza caminha alegremente para a desolação
às voltas do seu umbigo

não abranda a ausência que está em mim
qualquer que seja essa mulher sem rosto

definitivamente
assexuada

um raio de luz

um raio de luz
salva o resto do dia

os olhos são
pontos de equilíbrio

o que é que nos redime?

O que é que nos redime?
O que é que nos revive?
O que é que nos motiva?
O que é que nos levanta?
O que é que nos alegra?
O que é que nos faz falta?
O que é que não nos faz falta?
O que é que nos mata?

beethoven

Tuesday, July 1, 2008

assim chega o castanheiro

assim chega o castanheiro
tufos abrangentes
e flores de árvores vivas
árvores na encosta
flores simples das ervas
que secam irresistíveis
brancas amarelas
lilases cor de rosa
e o verde
e o castanho do pó
do caminho subindo
com os mosquitos
agarrados ao suor

suores e cores difíceis

suor e cores difíceis de escolher
de entre as demais a mais bonita
segundo os critérios régios
os bonitos olhos dela
na mesma montanha
virada a um lado
brilhante
de todos eles
foi o primeiro
que se regenerou
onde as primeiras vozes
desceram da falésia
alcantilada
todos os amores
nos caminhos de terra
ainda se isolam demais
vindos do fundo da terra
directos desejos de comida fresca
entre as sombras dos castanheiros
que refrescam as montanhas seladas
o nome delas tem a gloriosa descendência
de flores silvestres cobrindo a secura do chão
o pó influído pelas suas fina cores

o suor colado na pele

o suor colado na pele
a resina cheira
colada na mão
o braço avança
o cronómetro
continua a corrida

a luz dos candeeiros da rua

a luz dos candeeiros da rua
entra na cozinha
pela porta aberta
empurrada pela brisa
que quebra o sopro
quente que abafou o dia
e as franjas da porta
tremidas nas sombras
da parede de azulejos
encostada de uma forma
descontraída